domingo, 17 de julho de 2022

MADURO

Amadurecer emocionalmente é criar uma casca mais grossa? Uma armadura mais dura? Uma roupa de super-herói super tecnológica ou uma pele geneticamente modificada: blinda dos tiros, mas não restringe o movimento.

Quanto de um amadurecimento, se podemos chamar assim, é estabilizar. Adequar os nossos afetos a uma temperatura mais morna e amena... Recusar o superaquecimento e os congelamentos repentinos.

Hay que endurecerse? (Pero sin perder la ternura jamás...) Recusar a apatia, mas não perder. Perder a linha? A compostura? A postura?

A si mesmo?

Aliás, não se trata justamente de aprender a perder? Perder o afeto antes que se perca o interesse.

Perder no jogo dos afetos e dos trâmites do desejo, da negociação dos desejos, do mercado financeiro dos desejos, desigual, abstrato e especulativo: feito para aqueles versados nas regras ocultas e abonados pra começo de conversa.

Perder sem prender. Perder, mas não despedaçar. Perder e despedir. Perder de vista sem perder a vista. Aprender a perder parcelado e à vista.

Pagar o preço da perda sem entrar em falência.

Trata-se de domar o touro? Domesticar a fera? Fazer um delineado no olho do furacão? Transformar o mar aberto, revolto e inóspito na nossa piscina rasa, quente e cheia de urina e cloro?

Ou é muita ingenuidade e delírio de grandeza querer domar o indomável, conter o incabível e medir o incomensurável de acordo com os padrões científicos internacionais de medida?

Talvez a questão é justamente deixar o tsunami passar, mas num ambiente (ao menos um pouco) mais estruturado para conter os seus estragos. Não calar a fera, sem sucumbir a suas provocações. Montar o touro sem domar. E sem cair. E sem ferir. A si, e ao touro (que também é você).

Mas e quando a guarda não está alta e não é mais capaz guardar tudo em si mesmo?

Quando a casca não está grossa o bastante e a dúzia de ovos se despedaça na facilidade com que o vento sopra. Quando o termostato emocional segue desregulado e a mistura desagradável de clara, gema e casca frita aos nossos olhos? Quando não existe uniforme blindado nem pele impermeável e o corpo fere, arranha, dói e sangra.

Talvez a questão seja atualizar o repertório dos poderes para uma impossibilidade mais factível.

Deixar machucar. E machuca.

Para então investir em habilidades de regeneração, para ficar de corpo são, marcado e mole:

pronto pra sentir de novo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário