terça-feira, 14 de dezembro de 2021

 

volume

    aperto

        batida

              bombeia na 

volta

              bombeia na ida

         bomba

              aperto

         peito

           implode na caixa

           explode no vento

sábado, 4 de dezembro de 2021

POLITICAMENTE CORRETO

Politicamente correto. Na língua, na política. O que é o certo?

O que é a política? A horda de homens brancos ricos do congresso?

Conservadores, reacionários, de família… todos de terno

Que apoiam um fascista em troca de orçamento secreto


O que é a política, se não uma ausência?

Se não o vazio silencioso

Ensurdecedoramente silencioso

De cada corpo: marcado pela violência


O que é a língua?

Uma gramática?

Estática?

Um veículo fixo, neutro e objetivo?

Presente nos dicionários, nas bíblias e nos supletivos?

Um corpo mais morto do que vivo?


Não seria a língua um terreno de batalha?

A faca que em cada corpo entalha

Cicatrizes, tatuagens

Roupagens e a própria pele

A língua que cura e a língua que fere


A língua é a luta entre o correto e a falha

Discurso

Entre o curso violento do rio

E a canoa que resiste e encalha


A língua é a navalha

a navalha de baixo da língua da travesti que fala o pajubá

Da entidade no terreiro que entoa o iorubá

Das letras cifradas no pixo

O pixo agressivo no muro

Um muro muito mais agressivo

Que divide os de cá e os de lá


A língua é filha do latim?

Língua morta?

E cada língua indígena sepultada

No cemitério que chamamos de Brasil?

Não foram dez

Não foram cem

Foram mais de mil


A língua é a pronúncia torta

Do pedreiro analfabeto

Que depreda a língua

Mas que de pedra em pedra

Constrói o teto

Do acadêmico esnobe da academia brasileira de letras

A língua é uma puta treta

A língua é uma puta

A língua diz

A língua escuta

A língua é uma disputa


A língua não é só voz

A língua não é só letra

A língua também é gesto

Do sujeito surdo que desenha com sinais no ar

Verso e prosa, um discurso completo


Toda língua tem sotaque

Dos repentistas, dos atabaques

A língua mãe solo

Sem teste de paternidade


A língua do nordeste?

Eu conheço palavras baianas, sergipanas, alagoanas, pernambucanas, paraibanas

maranhenses, cearenses, piauienses e potiguares

Como existiria uma só língua em tantos lugares?

Uma língua para cada CEP, prédio, apartamento e número de identidade

E a língua do indigente, sem CEP, casa, nem documento

É gente?


De repente a língua se bifurca

Feito língua de cobra na cabeça da medusa

Feito cabeça de Hidra

Em cada tentativa de corte a língua se multiplica


A língua da senhora fina de meia idade

A língua que desafina bêbada num karaoke pela cidade

A língua que desafia toda forma de autoridade


A língua que desfia a roupa e mostra que o rei está nu

O gramático está nu

O latifundiário está nu

O banqueiro está nu

O patriarca está nu

O professor universitário está nu

O corretor da redação do Enem está nu

O bilionário está nu

O empresário está nu

O presidente está nu


A língua que geme quando dá o cu

Sua língua no meu cu


A língua que entope a pessoa de adjetivos

Numa overdose de predicados

A palavra-número que transforma pessoas em dados

Dado lançado à própria sorte

A necro-palavra insulto

Que sepulta o sujeito inculto

mesmo antes do coração ser parado

A necro-palavra morte


Mas a língua é moeda

Tem duas caras

Aliás

A língua é um polígono

De mais de mil faces

Cada uma delas,

um signo


Ela dá régua, compasso

Agulha, linha, tecido, tesoura

e às vezes até máquina de costura

A língua tecitura, colcha de retalhos


Embaralho as cartas e começo outra partida

E me coloco, duque coringa

No meio de uma canastra suja

O que você disse sobre mim, foi meu ponto de partida

Mas não será o meu ponto de chegada

Nem a estrada por mim asfaltada

Com as pedras jogadas no meu corpo no meio da rua

No meu jogo, as regras não são suas


Nas palavras que me fizeram eu mesmo me refaço

Desfaço o laço da minha forca

E pulo corda com a corda que me enforca

E dela, tiro força


Da palavra casta faço palavra festa

E desafio a palavra que cala

Convocando a massa

Integral, nutritiva e colorida

Numa canção que se levanta e protesta

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